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Mostrando postagens de abril, 2019

Efeito kuleshov

Me vejo passando por teu ponto tantas vezes que até parece que não existo mais E fotografo tudo pensando que estás em paisagem Sabe-se lá o porquê de ter perdido da minha lente tua imagem Miragem, coragem, viagem, são caminhos tão parecidos e distantes que nem parecem bobagem. Aprisionei teus beijos e meus focos sob um efeito de luz de fundo E vou correndo atrás de tu, congelando em foto esse mundo quando revelar nosso filme de verão acordarei sem teu brilho, e deitarei sem face naquele velho chão de papel carvão.

Por assim dizer

Então depois de tanto tempo, ficamos assim Ela roubava minhas poesias e eu a tua sanidade Ela era protagonista das fábulas, das doces vidas escritas que eu soltava por aí Eu era o algoz, cru e seco cheio de tristeza e loucura por aqui E depois, de vários livros que se perpetuaram por entre os dois destrambelhados E vários surtos a se ouvir falar pela cidade louca a se delirar Restaram só os dois, sem poema, só este último que de tão xoxo não tem nem rima De loucura não restou nem o mais pequeno dos delírios só restou a vida, onde o namoro da poesia com a insanidade se torna rima, se torna uma possível verdade, a se ouvir pela velha guarda da cidade.

Beijo amargo

A realidade vem me beijar na madrugada Sonhos, verdades, tristezas, idades Disso tudo, tiro a dor de não saber quem sou, bebendo dois cheiros no chão, na levada do soul Toca na noite o sangue da flor, e por cá vou escrevendo bases de rancor Horas à fio, o silêncio com frio, acende o rojão puxa o pavio. Dessa morte lenta quero ser filho, quero viver meus dias sem ouvir um tiro Na baixada o que canta é a arma da polícia, dos senhores, do pai que espanca Espanta, levanta, na real, tudo é fim na mão que o dedo aponta Os poderosos querem matar, querem regrar, não sabem conjugar o verbo amar Fale por você, viva por mim, só não termine meu sonho sem um fim...

Poderia escrever mensagens para você, mas prefiro poemas

É dureza me manter sóbrio Uma vez que provei da tua beleza É terrível me manter sério ao seu lado Sabendo eu que sou todo riso abobalhado É o fim do mundo ver teus olhos de tão longe Com essa memória de beijos no horizonte É tristeza lembrar de teus afagos Me admira não estarmos revirando na cama em laços É saudosa a forma como te olho Ainda que por venturas do destino É derradeira a forma como finjo uma despedida final Ao olhar em teus olhos e me sentir anormal É finalizador o último verso que escrevo Talvez um dia eu ganhe coragem e vou até aquilo que sempre vejo

Escrever

Sem direcionamento, apenas palavras soltas. É assim que um escritor amador se joga no mar à mercê do ócio criativo da mente espancada. Deitado à horas, tentado dormir. Agitado e perdido em temores e vícios. É assim que se escreve algo palatável, será? Os olhos pulsam em valsa triste, e a cabeça explode em ideias, memórias, medos, e tristezas. Faz parte do show. É claro, não esquecendo do amor meia boca ofertado, só que secreto. O escritor que se preze tem que fazer esse papelão algum dia. Ofertar secretamente seu amor à alguém. E viver por esse amor do mundo das ideias, como uma planta que precisa de sol para sobreviver e quiçá dar frutos. Não é nada fácil, nem difícil, escrever palavras ao casco do vento. Mas tem que se maltratar para que estas pulem em galopes ligeiros e silenciosos da alma do escritor.

Crônica urbana

Pulsa a cidade velha, cheia de odores e poucos valores. Lixos, bichos, loucos. Tudo misturado e socado em um drink soberbo para os profanos da vida. Em meio aos amputados, alastram as ruas os ratos e as baratas. A fumaça velha de morte sobe sem deixar saudade. Nada aqui parece ser vivo de verdade, são só restos esquecidos do que já foi alguma coisa um dia. No ponto de ônibus fico pensando, pensando e pensando. Em que inferno me perdi? Ruínas ao meus pés, sangue em minhas mãos inocentes, lágrimas em minha mente. Um dia a cidade já foi povoada de verdade, um dia era lembrada, hoje é esfacelada por ladrões de vida. O ponto se enche de luz, de gente, em um segundo, e tudo aquilo parece não fazer parte do que vi antes. Percebo à final, que fazemos parte de toda essa podridão, aos poucos, mais e mais.

Coração dos malandros

É na noite que cai Na roda de samba que sai O boa vida nasce das trepas Nasce das ruas em trevas Flertando com os sambas de viela São os gatunos, fazendo festa em miséria Malandro, astuto, boquiaberto Ladrão bom pra se ter por perto Chamam a atenção nas esquinas Batem carteira, baralho marcado, ladeados de concubinas Malandro é peça de xadrez Loucura e lucidez Nessa luz da cidade viúva São eles que a amam até embaixo de chuva Gozam na liberdade, na cara da maldade Fazem os sambas valerem pra toda idade Malandro não corre, deixa passar Gatuno não anda, começa a dançar Boa vida não se assusta, nos surpreende Velhaco não sacode, balança, não se prende Malandro não se vai, vira estrela no céu na noite de escuridão E no fim na solidão tens a brilhar a o luar, seu coração

Antes de tudo

O mundo antigo, bem do antigo mesmo, era feito de um povo bom Um povo que tinha uma estrela no lugar do coração esses daí, quando se iam, enchiam os céus de coração a brilhar na escuridão O tempo era dos grandes, grandes feitos, grandes amigos, grandes amores Mas esse mundão foi-se quebrando, aos poucos, rachando em horrores Um povo veio surgindo, por castigo do destino E o fim da era de ouro, foi chegando devagarinho